Gostamos de escrever e de pensar. Costumávamos trocar e-mails, mas decidimos expor nossas ideias a quem quer que queira vê-las, e assim surgiu o Abracabessa. Sem cedilha mesmo, porque tudo pode ser mudado - e mesmo que não seja para melhor, às vezes a mudança traz consequências fantásticas!

24 de dez. de 2010

Natal = Fim do mundo

Adoro festejar! Não é que você me encontre nas maiores badaladas, de jeito nenhum, mas se há um motivo mínimo a ser festejado, já me animo! A falta de dinheiro é que me impede de expandir esse lado geminiano autêntico.
Assim sendo, época de Natal é a minha cara. Ontem o Paulo me chamou para ver as vitrines de Nova Iorque (na TV, claro) porque adoro olhar vitrines. Não gosto de comprar, mas adoro olhar vitrines. A estética, a montagem, as cores, como se fossem instalações, com a iluminação combinando com as roupas, que se equilibram com os manequins e o fundo da loja. Adoro olhar jóias em vitrines. E papelarias são meu fraco. Agora, gosto mesmo é de presentear. Mais uma vez: me esbaldo no Natal! Porque é permitido, bem-vindo, às vezes inesperado, mas é sempre bom presentear.
Há alguns anos, porém, noto que a semana que antecede o Natal torna-se a mais estressante do ano. Todos os carros do mundo vêm para Maceió, para a Convenção-Anual-dos-Carros-Com-Apenas-Uma-Pessoa-Dentro. Deve ser porque nossa cidade é ponto de turismo de lazer, daí como Natal coincide com as férias de verão tudo conspira para a superpopulação que passa a desfilar por aí.
Mas o pior de tudo ainda é a pressa. A sensação de a-fazer, de que falta algo. Algo importante...tipo o peru "de Natal" (porque as pessoas comem peru, panetone, tudo que detestam durante o ano todo...deve fazer parte do equilíbrio prazer x sacrifício).
No ano passado decidi que não entraria nessa paranoia. Comecei comprando os presentes em outubro, com calma, aproveitando promoções, inclusive. Comprei algumas embalagens e outras ficaram para esta semana, na papelaria simpatissíssima perto de casa - ou seja, é um prazer ir lá. Fiz as embalagens em casa, para que Marina participasse - ela colocava o dedinho para segurar o papel ou fita e quando eu não pedia, dizia "Dedinho, mamãe?"
As pessoas lá fora continuam correndo, guiando automóveis, pegando ônibus, taxis (que demoram 30 minutos para chegar). Ainda penso, vendo tudo isso "Parece que o mundo vai acabar, oxe" mas estou bem tranquila, porque se acabar mesmo, vou partir tão descansada.....
Foto extraída de http://www.bemlegaus.com/

27 de out. de 2010

O Outubro Rosa é um movimento mundial, que teve início nos Estados Unidos.


Em 1990, em Nova York, a Fundação Susan G. Komen for the Cure realizou a primeira Corrida pela Cura, distribuindo entre os participantes laços cor-de-rosa. E é daí que vem o nome da campanha.


Seu principal objetivo é chamar a atenção direta para a realidade atual do câncer de mama e para a importância do diagnóstico precoce.

A ação mundial tem uma novidade: embeleza as cidades através da iluminação rosa de monumentos e locais históricos, mostrando de um modo feminino e bonito, a importância da luta contra o câncer que mais mata mulheres no mundo.
A primeira iniciativa do Outubro Rosa no Brasil foi a iluminação em rosa do Obelisco do Ibirapuera, em São Paulo, no dia 2 de outubro de 2002. A idéia partiu de um grupo de mulheres simpatizantes com a causa do câncer de mama apoiadas pela empresa européia de cosméticos Estée Lauder. Mas o movimento ganhou força no país em outubro de 2008, quando diversas entidades relacionadas ao câncer de mama iluminaram de rosa monumentos e prédios em suas respectivas cidades. Aos poucos, o Brasil foi ficando iluminado em rosa em São Paulo-SP, Santos-SP, Rio de Janeiro-RJ, Porto Alegre-RS, Brasília-DF, Salvador-BA, Teresina-PI, Poços de Caldas-MG e outras cidades.

O Brasil é mundialmente conhecido pelo seu maior símbolo, a estátua do Cristo Redentor no Rio de Janeiro-RJ. E pela primeira vez, o Cristo Redentor ficou iluminado de rosa no Outubro Rosa.

A Aviação Civil não ficou de fora! A AZUL pintou de rosa um avião, que voa enfeitando os céus. E nosso aeroporto, no dia 28/10/2010 (quinta-feira) receberá um grupo de mulheres da ONG RENASCER, de Maceió, que irá distribuir informações e laços rosa para quem quiser apoiar a campanha.
Mas não espere por quinta-feira, venha já amanhã com um laço rosa, uma blusa, camisa, um vestido rosa. Participe, divulgue, seja consciente!
No site Pink Ribbon Internacional podemos acompanhar as movimentações globais da ação. E aqui no Brasil a FEMAMA divulga a agenda nacional da ação no site http://www.femama.org.br/



12 de out. de 2010

“São sempre as causas perdidas que mais emocionam”*

Flagrei-me pensando sobre a falta de controle que temos em relação a vida e aos rumos que ela pode tomar. Descobri que ando cada vez mais encantada com essa nossa inabilidade em comandar o futuro, que pode resultar em belissimos finais.

Charlie Chaplin atribuía esse poder ao tempo, considerando-lhe o melhor autor, por sempre escolher os finais perfeitos. Eu tenho cá minhas dúvidas. Acaso, tempo, destino... “Se a vida é mesmo um filme, por onde anda o diretor?” *

O que compreendo é que ausente ou não, ele consegue superar expectativas e trazer o impossível aos olhos – “nada é impossível” também começou a fazer sentido pra mim – esse meu último fim de semana é um bom exemplo. Mas antes, acho mais coeso contar como tudo levou a esse acontecimento.

Acredito que todo mundo tenha um conjunto de referências ou um grupo de pessoas ou coisas que admire. Num mundo engarrafado de informações, cores e sons, há sempre algo que nos chame a atenção. Pois bem. Comigo não foi diferente. Meu “encantamento” girava em torno do rock de 80 desde muito cedo. Com o tempo o filtro foi sendo passado, e algumas bandas, como a Engenheiros do Hawaii se firmaram como minhas favoritas. Por ser curiosa, quis saber tudo o que envolvia os seus representantes, e não demorei a virar fã (termo popular, que eu particularmente acho genérico) de Humberto Gessinger – criador, compositor, instrumentista e manda chuva da banda.


A imagem do cara tímido e taxado de arrogante por inabilidade no jogo social midiático era puro atrativo para a adolescente crítica e reservada. Logo, essas e outras qualidades me chamaram a atenção no moço. Do Gessinger eu procurei saber e entender o que estava ao meu alcance. Das influências musicais e o gosto literário ao modo de mexer a cabeça, olhando pro alto, enquanto canta uma música n’algum lugar do Brasil.

Foi por causa dele que eu comecei a achar lindo o sotaque gaúcho (mais especificamente de PoA), e por que eu quero conhecer o RS. Foi por causa dele que eu entrei em contato com alguns autores renomados, além dos próprios da área de jornalismo, e que eu simpatizo com o Grêmio. E foi justamente por sua ausência, que comecei a tentar construir uma imagem pra guardá-la comigo. Era quase um amigo imaginário. E eu passei um bom tempo o acompanhando de longe, já que sabia que era quase impossível Rio Grande do Sul e Nordeste se cruzarem por aí.

Eis que um dia começa-se a especulação na internet a respeito de um possível show do Pouca Vogal (atual projeto do Gessinger e do Leindecker) em Caruaru, após um longo período sem fazer shows no NE. Apesar da enorme euforia, o show se confirmou, aconteceu e eu não pude ir.



Pouco depois anunciaram um novo show, dessa vez em Recife. Era uma nova oportunidade que surgia. Será que dessa vez iria rolar? “Aposto como HG vai e volta e eu não saio da minha cidade”, anotei revoltadamente em meu caderno. E era assim que tudo caminhava. Pelo menos até o fim de semana que antecederia o do show. De repente, numa conversa informal lá em casa, os dois colegas de blog decidiram que iriam comigo a Recife para assistir ao show.


Acho que foi a partir daí que eu comecei a aceitar que a vida é mesmo inconstante e que a gente não tem lá muito domínio sobre ela. “Num piscar de olhos tudo se transforma. Ta vendo? Já passou...” *.

Começou-se então na internet a especulação em torno do pocket show ou da sessão de autógrafos. Um site confirmava. HG ainda não. Dias depois avisaram que não aconteceria, mas o produtor do evento tinha uma surpresa: estava sorteando entradas no camarim a partir de perguntas via twitter. Lembro como se fosse hoje. As panelas aqui de casa também. Foram TRÊS queimadas num único dia.

Embora tenha me empenhado ao máximo, não ganhei a promoção e mais uma vez fiquei abatida. Não acreditava que me desprenderia de Maceió até Recife, depois de um sufoco dos diabos, e não traria comigo nem uma lembrança mais “viva” do meu amigo querido... Me senti injustiçada, por ser tão “conhecedora” e “merecedora” daquilo, mas não poder entrar...

Por hora deixei a história de escanteio. O fim de semana estava começando e eu queria mais era aproveitar. Conhecer partes de Recife que ainda não tive oportunidade, e quando chegasse o horário do show, ir lá e matar minha sede de música de qualidade. E assim o dia passou, sem ansiedade, sem correria. A maior prova disso é que nem eu, nem meus companheiros de viagem lembravam a hora do show. Só viemos nos ligar a isso depois que anoiteceu, quando fomos nos arrumar.
O show estava previsto para começar às 21h. Conseguimos chegar lar às 20h20min, ainda não estava muito cheio. De longe avistei um grupinho de cinco meninas, mais afastado do resto do pessoal. Deviam ter ganho a promoção da internet. A agonia começou a tomar conta: queria muito poder fazer uma delas desaparecer e entrar em seu lugar. Como não era possível, muitissimo motivada por tio Paulinho e Patrícia, resolvi me aproximar, e utilizei a técnica do “não pode vencer o inimigo, junte-se a eles”. Tentei a todo custo entrosamento com as meninas, que só me davam patada.

Fiquei algum tempo junto com esse pequeno número de sortudos, até que apareceu uma moça da produção. Com uma lista na mão ela ia chamando as pessoas que teriam acesso livre ao camarim. Ela já ia dando os primeiros passos em direção a entrada, quando eu, no auge do desespero, tirava a única (e última) carta da manga: Moça! Chamei-a, segurando seu braço. Eu sou jornalista. Sou de Maceió. Do jornal Da Hora. Vim aqui pra tirar uma foto dos dois, pode ser? Ela me pediu crachá, mas é claro que eu não tinha. A saída foi ser insistente. Cada vez que ela me mandava esperar, eu dava um passo a frente, e no fim, quando já não havia mais o que dizer, repetir desesperadamente, ”por favor”. Para tudo, e insistentemente. No fim das contas acho que ela teve pena de mim e me deixou ficar. Quando menos espero, lá estava eu junto ao grupo, andando em fila indiana até a porta do camarim. Compartilhávamos todos da mesma ansiedade. A prova era que a maioria se deu as mãos (coincidência ou não, a maioria era primo, irmão ou namorado, e eu, pra variar, sozinha, só tinha mesmo a minha mão, para segurar a outra. Fingi de séria e segui).
(abastecimento alimentício do meu jornal, gente)

Jamais vou esquecer a sensação de estar na porta e ver pela primeira vez o cara que esteve comigo durante anos, mas nunca em sua forma física. Até hoje, nas milhões de descrições que fiz, à milhões de pessoas que vieram me perguntar como consegui tal façanha, jamais consegui descrever algo aproximado com o que senti. Sei apenas que foi intenso, bonito e memorável. E que eu tremia, e como tremia, enquanto abria um sorriso enorme, como se estivesse de fato, reencontrando, pela primeira vez, um velho amigo.

(Duca Leindecker)

Fui falar primeiro com o Duca, que estava mais próximo e por quem eu não tinha tanta intimidade com a carreira como quanto a do loiro ao seu lado. Eu já tremia daí, mas ainda não tinha realizado o sonho por completo. Abracei, falei algumas coisas à la Galvão Bueno (rápido como quem narra uma partida de futebol), e fui falar com o meu gaúcho favorito.

(Humberto Gessinger)

Uns segundos depois e lá estava eu, de frente com Humberto, que me deu a mão e riu, simpaticamente. Peguei em sua mão e me aproximei de seu rosto, dando-lhe dois beijinhos (aqueles que você dá educadamente quando encontra alguém conhecido), apesar de tudo, obviamente, não tínhamos intimidade para um abraço apertado. Falei pra ele o mesmo que tinha dito ao Duca, “obrigado por ter vindo ao nordeste...”, acrescentando a dificuldade em comparecer ao show, inclusive que tinha brigado com meu pai, que não queria me deixar ir. Ele riu e falou algo como: nossa! Tu vieste de lá mesmo? Tiramos uma foto, pedi pra ele autografar o pedaço de papel que eu tinha no bolso (valeu Patrícia, e não empresta aquela caneta a ninguém... Lembre-se: HG já pegou nela! :D) e saí, depois que ele me desejou “uma boa viagem de volta”.


Na saída, a moça da produção riu e reparou que eu tremia muito. Dei-lhe um abraço e agradeci, tirei foto também com ela. Foi apenas na saída que realmente caiu a ficha do que acabara de acontecer: eu estava diante da minha maior referência musical! E isso me causou uma emoção enorme. Se alguém aqui já assistiu Maria do Bairro e lembra da quantidade de vezes que ela chorou na novela, pode apostar que eu me aproximei disso, naquela noite. Só que não era um choro doído. Era um choro de alegria, de agradecimento por ter conseguido algo que eu enxergava no patamar mais alto, e era como se de repente alguém colocasse a mão, pra que eu pudesse apoiar os pés, subir e contemplar aquilo por alguns instantes. E senti a mesma vontade de chorar durante o show, enquanto ele cantava e me fazia lembrar da sua presença ainda marcante.



Estar junto com os “De Fé” (palavra carinhosa que faz menção à música, e que ele usa pra designar quem verdadeiramente acompanha o seu trabalho) que assim como eu, cantam e se empolgam com cada canção, é uma troca de energia imensa. Presenciar um show em que ele faz todos os trejeitos já decorados no DVD é sair de lá com a sensação de que a noite foi “completa” e que nada estava a dever. Desde o jeito como ele tocava a guitarra, deixando os cabelos loiros caídos pra frente, o modo como fecha os olhos e levanta a cabeça, girando-a para os lados, à mania de contar piadas não tão engraçadas, mas cheias de graça, enquanto faz sons com a gaita.

(HG de frente pro público)

E pra finalizar, um “Pra ser sincero”, com direito a participação de toda a platéia, onde as milhares de pessoas uniam-se numa só voz: como se estivessem todos entregues de corpo e alma, exatamente onde queriam estar, depois de tanto tempo sem a presença concreta em território nordestino.
Saí de Recife assim, nesse fim de semana. Com a certeza de que a vida é mesmo linda de se viver, os momentos, cada um mais preciosos que os outros, e que a gente não só pode se surpreender como deve se deixar surpreender pelos acontecimentos, aceitando que não tem mesmo o menor poder de escolher o futuro, e pra terminar com mais uma frase deste excelente músico, “o caminho se faz andando, sem ensaio e nem rascunho.” Talvez a gente só precise estar apaixonada por algo, fazer as coisas por amor, ainda que pelas causas perdidas, já que são elas, quase sempre, as mais emocionantes.



* são frases ditas por HG na noite do show do Pouca Vogal.

7 de out. de 2010

POUCA VOGAL X DESPERDÍCIO DE PALAVRAS

* Pouca Vogal é um projeto paralelo de rock brasileiro criado pelos cantores gaúchos Duca Leindecker (líder e guitarrista da banda Cidadão Quem) e Humberto Gessinger (líder e baixista do grupo Engenheiros do Hawaii).

Nunca fui muito conhecedor do grupo Engenheiros do Hawaii. Da banda Cidadão Quem eu nada conheço. Do primeiro escutei umas músicas, as que mais eram tocadas em rádio e nas propagandas de apresentações do grupo.

Eis que tenho uma sobrinha - acho que devo gostar muito dela - que é enlouquecidamente fã do engenheiros e principalmente do Gessinger.

Ela soube que o Pouca Vogal – grupo de dois, a menor banda do rock gaúcho, formado por Humberto e Duca - vinha fazer uma apresentação em Recife. Ela, tricotando com a minha mulher, que também é louca por shows, inventou de assistir à apresentação. Minha sobrinha, quase se ajoelhando aos meus pés, me pediu com os olhos cheios dágua para que eu as levasse. Isso por que ela sabe que não gosto de shows. E não gosto, não pelo show, mas pelos atropelos causados desde as filas para conseguir ingressos, a chegada com estacionamento pago ou a chateação dos flanelas nos obrigando a pagar pelo espaço que é público. Ainda mais em recife. Sem falar no que mais me irrita: os atrasos para começar a apresentação – este atrasou uma hora e quinze - e o risco de assaltos que são constantes hoje em dia.

Gosto muito de música, mas diante disso tudo prefiro ficar em casa...

Fomos pra Recife. A viagem foi superagradável. Somos uma ótima companhia...

A apresentação foi maravilhosa. O que eu vi foi um espetáculo muito bem cuidado e produzido, uma estrutura muito bem montada no sentido de manter a independência do projeto, um público receptivo e uma performance de dois artistas que se renovaram e nos trouxeram um show vibrante, refinado, empolgante e acima de tudo artístico, no mais alto sentido dessa palavra. Os instrumentos vibravam com eles e eles vibravam com os instrumentos como poucas vezes vi um artista fazer. Toda essa vibração emanava dos dois e se derramava para a plateia que devolvia com carinho, participação de cantar junto e êxtase. Eram dois seres no palco manifestando-se com uma infinidade de instrumentos tocados com todo o corpo, dos pés à cabeça.

Humberto tocou com a boca, com as mãos e com os pés: voz, violão, viola caipira, harmônica de boca, piano, percussão eletrônica e outros instrumentos que desconheço; Duca fez voz, guitarra, violão, pandeirola e bumbo. Tocavam tudo ao mesmo tempo, numa coordenação impressionante.

Além da bela musicalidade das novas canções em Pouca Vogal, o que me chamou a atenção foi a capacidade de terem colocado uma nova roupagem, uma releitura em músicas há muito conhecidas.

Na terceira vez que saíram e voltaram atendendo aos pedidos de biz da plateia, gessinger brincou com o público e disse: “se vocês quiserem, nós temos um vasto repertório e podemos cantar até amanhã à noite...” risos eufóricos de todos. Ao que complementou: “afinal não temos nada para fazer amanhã, não é mesmo? O nautico, o santa cruz e o sport já jogaram hoje mesmo, né?”

O amanhã a que se referiu era o dia da eleição e da sua desimportância. O dia de voltar para casa para votar em... quem???

Em alguns trechos da estrada papéis com propagandas voavam sem rumo...

Sabendo que não chegaríamos a tempo de votar, entramos numa cidade para justificar nossa “ausência”. Uma cidade pequena e notadamente pobre, mas “enfeitada” de papéis espalhados pelas ruas com propagandas de políticos que mais tarde virariam lixo, lixo e mais lixo. Dinheiro transformado em LIXO. E assim foi por toda a viagem. Os papéis voavam e levavam ao léu palavras vãs, vazias, acompanhadas de imagens $CARA$, fotoshopeadas, frias, na verdade ridículas... – se um pulhítico tivesse que bancar sua campanha com o próprio bolso como nós artistas costumamos fazer com nossos trabalhos, certamente ele não o faria, pois ele não tem o amor e a generosidade que nós temos.

Chegando em Maceió vi a cidade suja, também tomada e forrada pelo lixo dos panfletos, adesivos, cartazes, banners e palavras gastas e amassadas, consoantes e vogais desirmanadas e jogadas fora, ultrapassadas, num processo que rouba o nosso dinheiro – e se repete cansativa e exaustivamente, não se renova e fica cada vez mais distante da arte renovada de, por exemplo, Duca e Gessinger.

Parabéns tches! Tche tem pouca vogal!

* fonte - wickpédia

“Eu não vim até aqui pra desistir agora”*



E essa frase virou a cara da Stéfany. Falando ainda mais rápido do que normalmente faz,
falando rápido e chorando,
falando rápido e chorando e sorrindo,

falando rápido e chorando e sorrindo e cantando,

falando rápido e chorando e sorrindo e cantando e dançando,

falando rápido e chorando e sorrindo e cantando e dançando e fotografando.

E foi assim, nesse clima de tietagem-ao-redor, que assistimos ao ótimo show do Pouca Vogal.

É verdade que a motivação de nossa viagem (minha e do Paulo) foi a Stéfany. Se não fosse ela, não estaríamos ali, sequer conheceríamos as músicas da “menor banda gaúcha de rock”, para usar as palavras de Gessinger. E não presenciaríamos um espetáculo de muita qualidade, dentro e fora do palco. Fãs histéricos havia sim, aos montes, mas também muito carinhosos e pouco desafinados (o que é uma enorme vantagem quando nós não conhecemos as músicas e tentamos ouvir a novidade).

Tudo contribuiu para uma experiência lúdica e prazerosa, o conforto do teatro, a qualidade do som, a leveza de tudo que vinha do palco: cenário, piadas tolas, alegria de estar tocando e cantando, animação, intimidade. E a música, como já disse, não vinha só de lá, mas de todos os lados, o que tomou o show de uma singularidade deliciosa.
E a Stéfany, que não foi até ali pra desistir, conseguiu autógrafo, foto, post do twiter e imagem na memória do Gessinger. A Stéfany, para quem um assento na oitava fila já estava ótimo, agora está nos relatos do ídolo e ele sabe que tem fãs malucos em Maceió. A Stéfany, que não desistiu, é uma lembrança muito viva na memória e na história do Pouca Vogal. Sem necessária citação no próximo livro do gaúcho, mas inegavelmente ele sabe quem é ela.
Por não ter desistido, acho que devemos agradecimentos a ela.

* É a frase de abertura da música Até o fim, de Pouca Vogal.


site oficial: http://www.poucavogal.com.br/

29 de ago. de 2010

"Não seja água na pedra" - Para Stéfany

Quando um jornal (grande ou pequeno) te contratar, e na noite de segunda-feira te mandar ao MISA para cobrir o show de uma banda de jazz, faz assim...


... vai para casa mais cedo, se põe bonita e perfumada, veste algo leve e confortável, calça sapatilhas de tecido com alguma rendinha ou brilho e dobra um casaco de filé sobre a bolsa

... chega ao MISA meia hora antes, bobeia um pouco pela praça ali em frente, ouve um pouco das conversas dos meninos e meninas que sempre há por ali

... vê o movimento

... vê então o público chegando, observa rostos, roupas, andares, companhias, feições, pressas, cabelos molhados

... sobe as escadas em tempo de escolher lugar. Com sorte, ouve ainda a passagem do som, visita as sacadas e olha a rua lá fora

... olha a rua lá fora. As lindas ruas de Jaraguá , seus postes, coqueiros, palmeiras, e o vento que vem da praia e a nada se iguala nesta Terra, que torna qualquer dia um veraneio.

O salão se enche e a música começa.

Ouça. Mesmo que deteste jazz.

Ouça mesmo.

Cada instrumento, um após o outro, tudo junto. Ouça. Esteja.

E aproveita, mais tarde, para compartilhar teu olhar, teu ouvir, teu sentir. Escreve o que não deu para anotar e deixa-me ler, no dia seguinte, em qualquer folha de qualquer jornal, ou no teu blog ou me manda um e-mail da matéria que não vingou. Mas escreveu, APRENDIZ DE JORNALISTA , sobre o que viveu – não sobre o que viu e menos ainda sobre o que ouviu dizer...

NOTAS:
- MISA Museu da Imagem e do Som de Alagoas. Veja http://www.cultura.al.gov.br/institucional/espacos-da-cultura/misa/misa/

- FILÉ Renda alagoana. Ver http://www.overmundo.com.br/overblog/onde-ha-rede-ha-renda
- JARAGUÁ Um dos primeiros bairros de Maceió. Ver http://pt.wikipedia.org/wiki/Macei%C3%B3
- APRENDIZ DE JORNALISTA é a Stefany http://apendizdejornalista.blogspot.com/

* Fui ao tal show, que foi FANTÁSTICO, saí com CD na mão e tal. Há uma hora de show, eu e Paulo na escada sem conseguir ver nem o cabo da guitarra, mas adorando tudo - chega um jornalista de um jornal local. crachá pendurado, suado, quase arfando, dá um toque para o fotógrafo fazer alguma foto. Estica o pescoço, não consegue ver nada. futuca o Paulo e pergunta "quem ta cantando agora?" "Sei não". Não sei o que ele escreveu sobre sobre os 5 minutos que ele viveu no MISA. Olha eles aí http://www.myspace.com/villalobosinjazz

26 de jul. de 2010

CLARO - A do Ronaldo, o Fenômeno


Eu, se fosse aliar meu nome ao de uma empresa, procuraria conhecê-la.
Eu, se fosse um Fenômeno, faria uma verdadeira investigação.
Mas, como Ronaldo não procura nem saber se está transando com gay ou com mulher, é de se esperar essa falta de cuidado mesmo.
Comprei um modem da Claro há mais de um ano. Há duas semanas contatei a Oi para testar o 3G deles de graça, durante 60 dias.
Recebi o chip da OI, que devo colocar no modem desbloqueado e é aí onde um novo problema com a Claro se inicia. Novo, sim, porque já tive vários e por isso mesmo me desfiz do número que mantinha com eles desde meu primeiro celular.
Na quinta-feira passada (22/07) fui à loja Claro da Fernandes Lima, vizinha ao Bompreço, defronte ao antigo Shopping Cidade. Fui atendida. Não foi gerado protocolo desse atendimento. Não me preocupei em exigi-lo porque considerei que seria algo tão simples! A atendente, no guichê 7, depois de muitas idas e vindas e muito perguntar tudo a todos os colegas, volta e me diz que não tem cabo para conectar o aparelho.
- Mas comprei esse aparelho aqui e vocês não têm cabo?
- É que não vendemos mais, a senhora vai ter que trazero cabo, ou então faz o procedimento em casa mesmo.
Imprimiu o passo, me deu um número de desbloqueio. E eu, em férias e decidida a não me abalar, sa´´i de lá pensando "Em casa resolvo, em casa resolvo, aummmm, aummmmm".
Acontece que meu Windows 7 não tem o caminho necessário para o desbloqueio. Liguei 1052 e falei com 5 atendentes e nenhum deles parecia compreender o que eu queria.
No sábado, voltei à Claro, com o cabo + contrato + nota-fiscal + identidade e cpf + modem + chip da OI. Fui atendida no guichê 8, novamente sem protocolo, novamente esperando calmamente, novamente certa de que tudo estaria resolvido em breve. Novamente, depois de longa atividade não sem em quê, volta o rapaz
- Sabe o que é? O notebook da loja tá quebrado. São dois, mas só tem um e tá quebrado, mas a senhora pode fazer em casa
- (expliquei porque não poderia)
- Mas a senhora pode ir na Claro do Shopping, lá eles fazem.
O shopping não era meu destino, não estava em meus planos e fica do outro lado da cidade. Como ainda estava em férias e minhas sobrinhas também, saí de lá e convidei minha mãe e as meninas para um passeio. Fomos, com Marina a tiracolo.
No shopping:
- Eita, não vai dar para fazer porque o computador daqui ta quebrado...
- Não, não é possível. Eu fui à loja do Farol duas vezes e a última resposta foi essa. E o computador daqui está quebrado. Certo. Por favor, me dê a ficha de atendimento que lhe entreguei.
- Um momento, senhora - disse a moça, sentindo cheiro de PROCON, na certa, pois finalmente alguém da Claro abriu atendimento protocolado.
Não queiram saber quão irada fiquei! No domingo procurei fazer o desbloquei nos computadores de amigos, mas a versão do Windows era a mesma do meu. Liguei novamente para a Claro 1052. A atendente, mais estressada do que eu, em voz alta, terminou o atendimento dizendo
- Então, minha senhora, se quiser desbloquer entre em contato com o fabricante do modem (repetiu isso 3 vezes após eu explicar que a obrigação é da operadora e o modem não apresenta defeito) ou então vá a outra cidade e procure a Claro de lá.
Dá para acreditar nessa resposta!? Pedi que repetisse o número do protocolo, pois eu não havia ouvidos os últimos dígitos.
Acessei o site e procurei atendimento virtual. Pedi que repetisse o último protocolo e a atendente deu o anterior. Pesquisei meu protocolo no site e ele simplesmente não existia! Sumiu! Deletado. Prático, não? Como procurar reparação, explicações, se quem manipula simplesmente deleta o "problema". Uma hora depois do bate-papo do atendimento virtual pedi que a pessoa registrasse a reclamação sobre as lojas citadas, bem como sobre a ausência do protocolo - que eu acho gravíssimo. Informei que procuraria a Anatel e o Procon, o que fiz hoje, segunda-feira, dia 26/07.
Os registros das reclamações, para acompanhamento ou checagem:
Protocolo do último atendimento (foram vários) no 1052 ---> 2010145915124, atendente Helen
Protocolo do último atendimento na loja Claro do Iguatemi---> 2010145521839, atendente Souza
Protocolo do último atendimento no site 2010145933571, atendente Nayara
Nº do processo no PROCON-AL 1110-011-334-8
Nº da reclamação na ANATEL 933829-2010
Pesquisem no site da ANATEL http://www.anatel.gov.br/Portal/verificaDocumentos/documento.asp?numeroPublicacao=246292&assuntoPublicacao=Ranking%20SMP%20-%20JUN%202010&caminhoRel=null&filtro=1&documentoPath=246292.pdf
Do PROCON-AL http://www.procon.al.gov.br/ranking/rk20.pdf
Do site de defesa do consumidor RECLAME AQUI http://www.reclameaqui.com.br/indices/7712/claro/

8 de jul. de 2010

Segue abaixo mais um texto lido e comentando via e-mail que decidimos compartilhar aqui:


O insustentável preconceito do ser


Rosana Jatobá, jornalista da Globo

Era o admirável mundo novo! Recém-chegada de Salvador, vinha a convite de uma emissora de TV, para a qual já trabalhava como repórter. Solícitos, os colegas da redação paulistana se empenhavam em promover e indicar os melhores programas de lazer e cultura, onde eu abastecia a alma de prazer e o intelecto de novos conhecimentos.

Era o admirável mundo civilizado! Mentes abertas com alto nível de educação formal. No entanto, logo percebi o ruído no discurso:

- Recomendo um passeio pelo nosso "Central Park", disse um repórter. Mas evite ir ao Ibirapuera nos domingos, porque é uma baianada só!

-Então estarei em casa, repliquei ironicamente.

-Ai, desculpa, não quis te ofender. É força de expressão. Tô falando de um tipo de gente.

-A gente que ajudou a construir as ruas e pontes, e a levantar os prédios da capital paulista?

-Sim, quer dizer, não! Me refiro às pessoas mal-educadas, que falam alto e fazem "farofa" no parque.

-Desculpe, mas outro dia vi um paulistano que, silenciosamente, abriu a janela do carro e atirou uma caixa de sapatos.

-Não me leve a mal, não tenho preconceitos contra os baianos. Aliás, adoro a sua terra, seu jeito de falar....

De fato, percebo que não existe a intenção de magoar. São palavras ou expressões que , de tão arraigadas, passam despercebidas, mas carregam o flagelo do preconceito. Preconceito velado, o que é pior, porque não mostra a cara, não se assume como tal. Difícil combater um inimigo disfarçado.

Descobri que no Rio de Janeiro, a pecha recai sobre os "Paraíba", que, aliás, podem ser qualquer nordestino. Com ou sem a "Cabeça chata", outra denominação usada no Sudeste para quem nasce no Nordeste.

Na Bahia, a herança escravocrata até hoje reproduz gestos e palavras que segregam. Já testemunhei pessoas esfregando o dedo indicador no braço, para se referir a um negro, como se a cor do sujeito explicasse uma atitude censurável.

Numa das conversas que tive com a jornalista Miriam Leitão, ela comentava:

-O Brasil gosta de se imaginar como uma democracia racial, mas isso é uma ilusão. Nós temos uma marcha de carnaval, feita há 40 anos, cantada até hoje. E ela é terrível. Os brancos nunca pensam no que estão cantando. A letra diz o seguinte:

"O teu cabelo não nega, mulata

Porque és mulata na cor

Mas como a cor não pega, mulata

Mulata, quero o teu amor".

"É ofensivo", diz Miriam. Como a cor de alguém poderia contaminar, como se fosse doença? E as pessoas nunca percebem.

A expressão "pé na cozinha", para designar a ascendência africana, é a mais comum de todas, e também dita sem o menor constragimento. É o retorno à mentalidade escravocrata, reproduzindo as mazelas da senzala.

O cronista Rubem Alves publicou esta semana na Folha de São Paulo um artigo no qual ressalta:

"Palavras não são inocentes, elas são armas que os poderosos usam para ferir e dominar os fracos. Os brancos norte-americanos inventaram a palavra 'niger' para humilhar os negros. Criaram uma brincadeira que tinha um versinho assim:

'Eeny, meeny, miny, moe, catch a niger by the toe'...que quer dizer, agarre um crioulo pelo dedão do pé (aqui no Brasil, quando se quer diminuir um negro, usa-se a palavra crioulo).

Em denúncia a esse uso ofensivo da palavra , os negros cunharam o slogan 'black is beautiful'. Daí surgiu a linguagem politicamente correta. A regra fundamental dessa linguagem é nunca usar uma palavra que humilhe, discrimine ou zombe de alguém".

Será que na era Obama vão inventar "Pé na Presidência", para se referir aos negros e mulatos americanos de hoje?

A origem social é outro fator que gera comentários tidos como "inofensivos" , mas cruéis. A Nação que deveria se orgulhar de sua mobilidade social, é a mesma que o picha o próprio Presidente de torneiro mecânico, semi-analfabeto. Com relação aos empregados domésticos, já cheguei a ouvir:

- A minha "criadagem" não entra pelo elevador social !

E a complacência com relação aos chamamentos, insultos, por vezes humilhantes, dirigidos aos homossexuais ? Os termos bicha, bichona, frutinha, biba, "viado", maricona, boiola e uma infinidade de apelidos, despertam risadas. Quem se importa com o potencial ofensivo?

Mulher é rainha no dia oito de março. Quando se atreve a encarar o trânsito, e desagrada o código masculino, ouve frequentemente:

- Só podia ser mulher! Ei, dona Maria, seu lugar é no tanque!

Dependendo do tom do cabelo, demonstrações de desinformação ou falta de inteligência, são imediatamente imputadas a um certo tipo feminino:

-Só podia ser loira!

Se a forma de administrar o próprio dinheiro é poupar muito e gastar pouco:

- Só podia ser judeu!

A mesma superficialidade em abordar as características de um povo se aplica aos árabes. Aqui, todos eles viram turcos. Quem acumula quilos extras é motivo de chacota do tipo: rolha de poço, polpeta, almôndega, baleia ...

Gosto muito do provérbio bíblico, legado do Cristianismo: "O mal não é o que entra, mas o que sai da boca do homem".

Invoco também a doutrina da Física Quântica, que confere às palavras o poder de ratificar ou transformar a realidade. São partículas de energia tecendo as teias do comportamento humano.

A liberdade de escolha e a tolerância das diferenças resumem o Princípio da Igualdade, sem o qual nenhuma sociedade pode ser Sustentável.

O preconceito nas entrelinhas é perigoso, porque , em doses homeopáticas, reforça os estigmas e aprofunda os abismos entre os cidadãos. Revela a ignorancia e alimenta o monstro da maldade.

Até que um dia um trabalhador perde o emprego, se torna um alcóolatra, passa a viver nas ruas e amanhece carbonizado:

-Só podia ser mendigo!

No outro dia, o motim toma conta da prisão, a polícia invade, mata 111 detentos, e nem a canção do Caetano Veloso é capaz de comover:

-Só podia ser bandido!

Somos nós os responsáveis pela construção do ideal de civilidade aqui em São Paulo, no Rio, na Bahia, em qualquer lugar do mundo. É a consciência do valor de cada pessoa que eleva a raça humana e aflora o que temos de melhor para dizer uns aos outros.

PS: Fui ao Ibirapuera num domingo e encontrei vários conterrâneos. ..

Rosana Jatobá

Rosana Jatobá é jornalista, graduada em Direito e Jornalismo pela Universidade Federal da Bahia, e mestranda em gestão e tecnologias ambientais da Universidade de São Paulo. Também apresenta a Previsão do Tempo no Jornal Nacional, da Rede Globo.

Esse texto é parte da série de crônicas sobre Sustentabilidade publicada na CBN

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E por falar em preconceito gostaria de colocar uma opinião baseada no que vi na copa do mundo de 2010 realizada no continente africano:


Primeiramente escutei inúmeros comentários de que a áfrica não teria condições de realizar uma copa do mundo, inclusive alguns dizendo que a toda poderosa alemanha já estava na alça de mira preparada para “abraçar a causa”, caso a áfrica não conseguisse realizar o evento. Depois reclamaram da bola, do barulho das cornetas - as chamadas vuvuzelas – que, aqui pra nós é um saco mesmo, mas se fosse em outro canto ninguém ia pedir pra parar nada.

Eis que começa a copa. e o que vi?

A começar pela propaganda da coca cola, que sempre apresenta produções muito requintadas e até emocionantes devido ao cuidado que salta aos olhos em suas campanhas. Fizeram uma propaganda horrorosa com meninos negros e pobres correndo em campos de terra, subindo penhascos e estambocando seus enormes joelhos, fugindo desesperados de monstros que mais parecem lixões que os perseguem implacavelmente.

terá sido coincidência que os chamados "favoritos", representados pelos “irmãos de cima”, tenham tido uma apresentação tão pífia? Pois é... itália, frança, inglaterra, estados unidos, austrália com seu pior time que já vi jogar, não deram a devida importância a essa copa por que ela foi realizada na áfrica. Levaram o que tinham de pior em seus elencos e foi nisso que deu: quando abriram os olhos a copa tinha ido pro brejo. Até a grécia apresentou um futebol sonolento, enfadonho, chegando ao irritante. A própria alemanha quase sai e só passou - no pau do canto como dizia minha avó, quando a gente passava apertado de um ano pro outro na escola – por que o seu pragmatismo inconsciente de tão arraigado despertou e botou o time pra correr e tentar pelo menos jogar.

Por outro lado, vi os times representantes da áfrica, especialmente a nigéria e camarões, de quem eu muito esperava e temia, num possível confronto com o brasil, completamente apáticos cometendo erros “incometíveis”, aceitando, como encantados, em quase todas as partidas, uma supremacia inexistente, pois os adversários quase caíam em campo, sonolentos que estavam. Times totalmente desprovidos de vontade, garra, entregando o ouro pra ninguém. fizeram da copa olixão da coca cola. e haja perseguição!...

Paulo Caldas

26 de jun. de 2010

Sobre a relação Mulher bonita x Marido Rico

Como deixamos claro na página inicial deste blog, a idéia de compartilhar nossos pensamentos aqui surgiu a partir de conversas virtuais, em trocas de e-mails. E foi numa destas recentes trocas, que surgiu mais um assunto que acreditamos ser pertinente compartillhar aqui para possíveis extensões do assunto. Conversávamos sobre o e-mail: " Mulher bonita & Marido rico", que circula pelas contas de @ internet afora:


PROCURA-SE MARIDO RICO
Saiu no Financial Times (maior jornal sobre economia do mundo).

Uma moça escreveu um email para o jornal pedindo dicas sobre "como arrumar um marido rico".

Contudo, mais inacreditável que o "pedido" da moça, foi a disposição de um editor que, muito inspirado, respondeu à mensagem de forma muito bem fundamentada.


E-mail da MOÇA:
"Sou uma garota linda (maravilhosamente linda) de 25 anos. Sou bem articulada e tenho classe. Estou querendo me casar com alguém que ganhe no mínimo meio milhão de dólares por ano. Tem algum homem que ganhe 500 mil ou mais neste jornal, ou alguma mulher casada com alguém que ganhe isso e que

possa me dar algumas dicas?

Já namorei homens que ganham por volta de 200 a 250 mil, mas não consigo passar disso. E 250 mil por ano não vão me fazer morar em Central Park West.

Conheço uma mulher (da minha aula de ioga) que casou com um banqueiro e vive em Tribeca! E ela não é tão bonita quanto eu, nem é inteligente.

Então, o que ela fez que eu não fiz? Qual a estratégia correta? Como eu chego ao nível dela? (Raphaella S.)"
Resposta do editor do jornal:

"Li sua consulta com grande interesse, pensei cuidadosamente no seu caso e fiz uma análise da situação.

Primeiramente, eu ganho mais de 500 mil por ano. Portanto, não estou tomando o seu tempo a toa...

Isto posto, considero os fatos da seguinte forma: Visto da perspectiva de um homem como eu (que tenho os requisitos que você procura), o que você oferece é simplesmente um péssimo negócio.

Eis o porquê: deixando as firulas de lado, o que você sugere é uma negociação simples, proposta clara, sem entrelinhas : Você entra com sua beleza física e eu entro com o dinheiro.

Mas tem um problema. Com toda certeza, com o tempo a sua beleza vai diminuir e um dia acabar, ao

contrário do meu dinheiro que, com o tempo, continuará aumentando. Assim, em termos econômicos, você é um ativo sofrendo depreciação e eu sou um ativo rendendo dividendos. E você não somente sofre depreciação, mas sofre uma depreciação progressiva, ou seja, sempre aumenta!

Explicando, você tem 25 anos hoje e deve continuar linda pelos próximos 5 ou 10 anos, mas sempre um pouco menos a cada ano. E no futuro, quando você se comparar com uma foto de hoje, verá que virou um caco. Isto é, hoje você está em 'alta', na época ideal de ser vendida, mas não de

ser comprada. Usando o linguajar de Wall Street , quem a tiver hoje deve mantê-la como

'trading position' (posição para comercializar) e não como 'buy and hold' (compre e retenha), que é para o quê você se oferece...

Portanto, ainda em termos comerciais, casar (que é um 'buy and hold') com você não é um bom negócio a médio/longo prazo! Mas alugá-la, sim! Assim, em termos sociais, um negócio razoável a se cogitar é namorar.

Cogitar...Mas, já cogitando, e para certificar-me do quão 'articulada, com classe e maravilhosamente linda' seja você, eu, na condição de provável futuro locatário dessa 'máquina', quero tão somente o que é de praxe: fazer um 'test drive' antes de fechar o negócio...podemos marcar?
(Philip Stephens, associate editor of the Financial Times - USA)
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Sabe aqueles e-mails nos quais a gente não pode confiar mas pode acreditar? É assim: vc não sabe se é real, mas sabe que bem poderia ser...É o caso deste. Por menos que eu queira admitir, desde que participei de movimento feminista - certamente por estar mais atenta ao assunto - tenho observado muitas mulheres com o tipo de ideia da moça abaixo. É grosseiro porque está escrito, mas no dia-a-dia se vê/ouve isso a todo tempo, mas não há crítica, não se reflete sobre o assunto.


Ouço mulheres da MINHA IDADE (não com 15 ou 25) com filhos, mas solteiras, dizendo que queriam um homem que ganhasse R$ "X", mas que não pretendem parar de trabalhar e de ganhar "seu" dinheiro, que será dela e dos filhos. Ou seja, o homem-parceiro-amor-da-minha-vida vai trabalhar para a família e ela vai trabalhar para si e sua prole. Justo? Nem um pouco! E a bendita frase "Só tem mulher quem pode", que é usada pelas mais jovens para explicar porque não saem com quem não tem carro ou não paga a conta ou não oferece presentes caros.

Minha mãe é viúva e teve que trabalhar muito para nos sustentar. Acho que por isso fiquei com a ideia pervertida de que é minha obrigação, por minha condição de "ser social", trabalhar para me manter e me sentir feliz, orgulhosa com isso, ao invés de viver à beira de ser salva da situação.

Acho tão absurdo estarmos em 2010 e ainda existir esse tipo de piada, de mulher, de situação, de indignação...tudo que eu queria era poder dizer à Marina, daqui a alguns anos "Ah, no tempo da minha avó as mulheres dependiam dos homens e se orgulhavam disso...". Marina vai ver que ainda É assim. Está mudando, mas ainda É assim.
Obs.: Minha avó foi casada várias vezes e nunca dependeu de homem nenhum...acho que minha ancestralidade joga a meu favor rs

 Falar disso não é chover no molhado. A indignação não pode NÃO ser expressada, certo? Mesmo que o assunto seja mofado e nos remeta a algum tempo depois da Era do Gelo...

(Patrícia)
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Eu já tinha visto esse email antes, e concordo quando você diz que a gente não pode confiar, mas pode acreditar. Aliás, no meu caso imaginei até a cena: No fim das contas a mulher aceita o convite do cara que respondeu, pq vai querer mostrar pra ele que é um investimento confiável (bonita, magra, etc), pensando que ele possa se convencer e querer algo mais duradouro. Infelizmente é isso ai. Algumas mulheres encaram os atributos físicos que possuem como forma de sedução para conseguir determinadas coisas. E alguns homens, pra ser bem sincera eu acho que a maioria, ve a mulher da mesma forma... De acordo com o peito, a bunda, a barriga e o rosto que elas têm. Ambos querem negociar esse "produto". Pq que propaganda do dia dos namorados so aparece mulher de langerie? Pq é tão mais comum ver mulheres prostitutas? Pq o corpo das mulheres parece ser tratado mesmo como mercadoria. Uma mercadoria que assim como outras do mundo consumista perde a graça com o tempo, e precisa ser trocada. Por isso que o cara fala que ela é uma peça a ser comercializada (como algo em promoção, ponta de estoque), mas não adquirida (vai comprar do estoque, sabendo que tem peça mais nova pra chegar?). Algo mesmo tão retrógrado e tão idiota.


Eu já ouvi milhares de vezes da boca de conhecidas a pérola "só tem homem quem pode", principalmente referindo-se à caprichos (r$) que eles se submetem a fazer para agradá-las. Taí outra frase mais babaca, mais pobre e mais sem classe que eu já ouvi. Seria a mesma coisa que dizer só tem carro quem pode por combustível, só come quem pode comprar comida, só dorme quem tem cama, ou seja = relação propriedade $ x objeto.
O que eu acredito é que toda relação é uma troca de interesses, disso não há do que fugir. Você nasce por que de alguma forma sua mãe queria/procurou ter um bebê. E aí cria um laço com ela pq depende dela pra sobreviver. Cria laços na escola pq precisa viver em comunidade, e tem algum tipo de relação amorosa também por uma troca de interesses. Só que esses interesses variam, muito. No meu caso, acho que procuro (procuro não, que eu nao quero objeto, hehe) um cara que goste dos mesmos estilos de música/literatura/cinema, que goste de conversar, seja mais alto e tão confuso quanto eu, pra entender minhas viagens, etc, será uma troca... De experiências, vivências, cultura... Mas não deixará de ser. No caso do grupo ao qual a mulher retratada pertence, ela oferece prazer sexual pelo prazer material. E não parece pensar numa possível cumplicidade, o importante é poder se mudar pra casa da rua X. Pra mim infelizmente isso ainda é um resquício dos tempos passados, em que a mulher não tinha uma vida profissional, e a vida era casar, ter filho e cuidar da casa. E diante disso, tinha que se preocupar em arrumar um "bom partido" pra sustentar a turma toda, já que ela não podia fazer nada pra contribuir. Mas e agora, mulherada? Que a gente pode votar, trabalhar, estudar, e se aperfeiçoar quantas vezes quiser numa área? Precisamos mesmo nos submeter à coisas tão pequenas, como o desdém de um homem a um corpo de uma mulher que naturalmente vai envelhecer? Ou será que os homens permanecem sempre gatinhos? ¬¬ E ainda ficam pior viu, pq pelo menos eu nunca conhecí uma senhora sequer careca! hahaha. Beijo!

(Stéfany)
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8 de jun. de 2010

GEMAS

Gemas sempre são redondas
Até que tentam voar...

Um espreguiço,
E tornam-se pássaros a gorjear,
Um passo
E uma pessoa passa a passear,
Um ganido
E um cão passa a ladrar

Gemas sempre são redomas
Até que tentam partir, levitar,
Criar asas, mergulhar,
Em si e no azul do pensar
Rodilhas a iluminar
Gemas sempre são luares
Segregando serenar

Seres sempre singulares
Escorrem na escuridão
Espalham-se à multidão,
Nascendo acima dos ares
Enchendo o mar de “brilhares"
E pingos de amanhecer...

Cambaxirras e canários,
Craviolas, campanários,
Acendem o alvorecer
Enchendo o ar de aromas
Gemas sempre são redomas
Até que tentam parir, peneirar,
Criar rumos, caminhar,
Em si e no azul do pensar...




Paulo Caldas – Junho 2010

31 de mai. de 2010

Luzes

Uma mulher acende velas. Naquela janela em frente, bem ali, uma mulher acende velas. Ela fecha a vidraça, a chama sobe alto, depois diminui, então entreabre o postigo e o vento que vem da rua em nada interfere na dança da chama. Deve haver um móvel onde fica o cachepot. Não usa candelabro ou castiçal, nem algo improvisado, mas um cachepot vasado, pois quando a vela está pequena forma-se uma figura parecida com flor ou estrela. É o melhor momento da vela, quando está pequena, porque a chama se agita sem motivo, torna-se inusitada, sai da fleuma de sua única obrigação de iluminar e pende então para qualquer lado, sem motivo nem brisa.


Terá perfume aquela vela? Penso que sejam velas sempre iguais, ao menos no tamanho o são. Se uma for perfumada, todas serão. Se não servirem para perfumar o ambiente, para que acende as velas, essa mulher?

Nunca, até hoje, fui muito além nos pensamentos sobre ela. É já noite quando chego em casa e as rotinas de chegar sempre terminam em meu quarto. Abro então minha janela e já procuro a luz que vem da outra. É tão natural quanto abrir os olhos ao som do despertador e procurar o sol para estar certa de não ser um sonho, para ter a triste certeza de precisar deixar as cobertas e me tirar do melhor do dia. Nunca a vi, nem dela tenho qualquer curiosidade, não quero saber com quem mora ou do que gosta ou mesmo para que acende as velas.

Pergunto isso, de mim para mim, com a mesma intenção de saber se está “Tudo bem?” com o rabugento vendedor de cocada. Se algum dia ele decidir responder irá atrapalhar todo o meu dia. Mesmo assim vou parar para ouvi-lo, e se for algo triste vou me comover e ficar muito penalizada e até vou ajudar, porque as pessoas tristes me dão certo alento, é bom saber que há pessoas com problemas piores que os meus e que eu, não podendo resolver os meus, faço diferença na vida alheia. É por isso que faço caridade. Não sei as outras pessoas, mas eu faço caridade porque não quero passar de todo por incompetente – “Não resolvo os meus porque são problemas terríveis, mas ajudo muita gente!”. Tem funcionado.

Escorrego a cortina e fecho minha janela, mas o tecido fino deixa aquele brilho fraquinho, lá longe, como se a distância fosse de anos e não de alguns passos. Nunca vi homem de coque, mesmo que traga cabelos compridos, por isso sei que é uma mulher. E sei que acende velas.

Meu gato morreu. Comeu algo envenenado, creio. Essa foi a explicação para todas as mortes felinas da minha infância, por isso mantenho a ideia de que gatos não adoecem nem têm morte natural, todos são assassinados, insistentemente, 7 vezes. De onde vem tanto ódio aos gatos? Será inveja de sua ascendência leonina? O meu não merecia inveja de ninguém. Vira-lata, bandoleiro, infiel como ele só, já estava aqui quando vim morar, mas era bem cuidado então suponho que deixou a família e voltou para “sua” casa. Dizem que esses bichos se apegam à moradia e não às pessoas. Agora foi embora de vez – ou não, quem sabe? Sei que não volta mais de madrugada, não grita no telhado nem na minha porta, não sobe na minha cama, não o derrubo mais, nem se lambe, nem me atrapalha o caminhar, nem me olha. Se ninguém me olha, como sei se existo? O gato não me olha, o vendedor de cocadas não me responde, a dona da janela não se importa de ser observada por mim. Eu existo?

Deve ter viajado. Há dois dias as janelas abertas não mostram movimento na casa. Não estou preocupada com ninguém, tanto que olho apenas para ver se alguém acende a vela, alguma vela, ou o resto da que já esteja lá, caso não tenha queimado por completo.

Terminei de arrumar a última caixa. Os móveis foram alugados com o imóvel, ficarão todos, trouxe apenas roupas e enxoval de cozinha. Nunca tirei uma pequenina lasca de parede, nenhuma quina se quebrou em mim, não há crianças para riscar paredes e as visitas, civilizadas, nunca barbarizaram por aqui. Entrego tudo como encontrei. Menos o gato, que não está mais, mas não por culpa minha, foi veneno, mas não eu. As pessoas dirão, amanhã, quando vieram visitar para conhecer ou alugar: “Nossa, parece que ainda mora alguém, tão arrumado está” e nunca entendi essa frase, pois é justamente o oposto, se mora alguém, deve estar sujo, porque a vida marca as coisas. O rosto, o colchão, o chuveiro, a pintura, a fritura, o reboco, o suor, a lâmpada, a sujeira no rejunte, o batom, o lenço, a vela. Se alguém morasse aqui haveria marcas, não há cuidado que apague as marcas de uma vida. Vida discreta que seja, tímida, resumida, sumida, leve, lenta, suave, fugida. Vou deixar as caixas assim mesmo, sem lacrar, não quero ir à venda buscar fita adesiva.

Trancou a porta, passou a chave pela fresta dentro do envelope com um bilhete “Depositei o último mês. O gato foi envenenado, não vai incomodar o próximo inquilino”.

30 de mai. de 2010

Luzes

Uma mulher acende velas. Naquela janela em frente, bem ali, uma mulher acende velas. Ela fecha a vidraça, a chama sobe alto, depois diminui, então entreabre o postigo e o vento que vem da rua em nada interfere na dança da chama. Deve haver um móvel onde fica o cachepot. Não usa candelabro ou castiçal, nem algo improvisado, mas um cachepot vazado, pois quando a vela está pequena forma-se uma figura parecida com flor ou estrela. É o melhor momento da vela, quando está pequena, porque a chama se agita sem motivo, torna-se inusitada, sai da fleuma de sua única obrigação de iluminar e pende então para qualquer lado, sem motivo nem brisa.


Terá perfume aquela vela? Penso que sejam velas sempre iguais, ao menos no tamanho o são. Se uma for perfumada, todas serão. Se não servirem para perfumar o ambiente, para que acende as velas, essa mulher?

Nunca, até hoje, fui muito além nos pensamentos sobre ela. É já noite quando chego em casa e as rotinas de chegar sempre terminam em meu quarto. Abro então minha janela e já procuro a luz que vem da outra. É tão natural quanto abrir os olhos ao som do despertador e procurar o sol para estar certa de não ser um sonho, para ter a triste certeza de precisar deixar as cobertas e me tirar do melhor do dia. Nunca a vi, nem dela tenho qualquer curiosidade, não quero saber com quem mora ou do que gosta ou mesmo para que acende as velas.

Pergunto isso, de mim para mim, com a mesma intenção de saber se está “Tudo bem?” com o rabugento vendedor de cocada. Se algum dia ele decidir responder irá atrapalhar todo o meu dia. Mesmo assim vou parar para ouvi-lo, e se for algo triste vou me comover e ficar muito penalizada e até vou ajudar, porque as pessoas tristes me dão certo alento, é bom saber que há pessoas com problemas piores que os meus e que eu, não podendo resolver os meus, faço alguma diferença na vida alheia. É por isso que faço caridade. Não sei as outras pessoas, mas eu faço caridade porque não quero passar de todo por incompetente – “Não resolvo os meus porque são problemas terríveis, mas ajudo muita gente!”. Tem funcionado.

Escorrego a cortina e fecho minha janela, mas o tecido fino deixa aquele brilho fraquinho, lá longe, como se a distância fosse de anos e não de alguns passos. Nunca vi homem de coque, mesmo que traga cabelos compridos, por isso sei que é uma mulher. E sei que acende velas.

Meu gato morreu. Comeu algo envenenado, creio. Essa foi a explicação para todas as mortes felinas da minha infância, por isso mantenho a ideia de que gatos não adoecem nem têm morte natural, todos são assassinados, insistentemente, 7 vezes. De onde vem tanto ódio aos gatos? Será inveja de sua ascendência leonina? O meu não merecia inveja de ninguém. Vira-lata, bandoleiro, infiel como ele só, já estava aqui quando vim morar, mas era bem cuidado então suponho que deixou a família e voltou para “sua” casa. Dizem que esses bichos se apegam à moradia e não às pessoas. Agora foi embora de vez – ou não, quem sabe? Sei que não volta mais de madrugada, não grita no telhado nem na minha porta, não sobe na minha cama, não o derrubo mais, nem se lambe, nem me atrapalha o caminhar, nem me olha. Se ninguém me olha, como sei se existo? O gato não me olha, o vendedor de cocadas não me responde, a dona da janela não se importa de ser observada por mim. Eu existo?

Deve ter viajado. Há dois dias as janelas abertas não mostram movimento na casa. Não estou preocupada com ninguém, tanto que olho apenas para ver se alguém acende a vela, alguma vela, ou o resto da que já esteja lá, caso não tenha queimado por completo.

Terminei de arrumar a última caixa. Os móveis foram alugados com o imóvel, ficarão todos, trouxe apenas roupas e enxoval de cozinha. Nunca tirei uma pequenina lasca de parede, nenhuma quina se quebrou em mim, não há crianças para riscar paredes e as visitas, civilizadas, nunca barbarizaram por aqui. Entrego tudo como encontrei. Menos o gato, que não está mais, mas não por culpa minha, foi veneno, mas não eu. As pessoas dirão, amanhã, quando vierem visitar para conhecer ou alugar: “Nossa, parece que ainda mora alguém, tão arrumado está” e nunca entendi essa frase, pois é justamente o oposto, se mora alguém, algo está sujo, porque a vida marca as coisas. O rosto, o colchão, o chuveiro, a pintura, a fritura, o reboco, o suor, a lâmpada, a sujeira no rejunte, o batom, o lenço, a vela. Se alguém morasse aqui haveria marcas, não há cuidado que apague as marcas de uma vida. Vida discreta que seja, tímida, resumida, sumida, leve, lenta, suave, fugida. Vou deixar as caixas assim mesmo, sem lacrar, não quero ir à venda buscar fita adesiva.

Trancou a porta, passou a chave pela fresta dentro do envelope com um bilhete “Depositei o último mês. O gato foi envenenado, não vai incomodar o próximo inquilino”.

7 de mai. de 2010

"Chuva de contairnes, entertainers no ar".

Big Brother Brasil. Rebolation. Carnaval. Ressaca do carnaval. Gaiola das Popozudas. Sorria, você está na Record. Plantão de Polícia. Quem deve deixar a casa? Vote agora! A fazenda. O Fuxico. Copa do mundo. Esquadrão da moda. Zorra Total. Casseta e Planeta. Gugu ou Faustão? NxZero. De volta pra minha terra. Swinga, Requebra, Samba Maceió.



Sabe aquela época lá do colégio em que você se sentia sufocado assistindo aula de química e torcia pra tocar logo pro intervalo? Então, parece que agora todos nós podemos pular essa parte chata e ir direto pro pátio, para a hora do recreio!
Não entendeu como? Super simples. Basta ligar a televisão ou outro meio de espaço midiático como a internet, e observar o estilo de conteúdo ao qual estamos constantemente sendo bombardeados.
É o regime novo da atriz que emagreceu 10 kgs em 1 mês, um cantor que está de casinho novo, a filha de um outro artista, que nem é do meio, mas já ganha condição de celebridade, ou mesmo o seu Zé da esquina que foi ferido num episodio violento, e ainda agoniza, enquanto as câmeras se voltam atentas para o seu corpo.
“Por que a noticia é um show”, diz frequentemente um locutor de um programa de rádio AM. E baseados nesse espetáculo é que os meios de expressão da mídia resolvem agir. Programas e noticias que coloquem o expectador á par de seus direitos, sejam eles coletivos ou individuais, são desconsiderados. Porém o BBB, o rebolation e outros tantos dentre os citados acima que nos deixam apenas passivos e nada nos acrescentam, chovem aos montes.
E digo isso por que me recordo da época em que o BBB ia ao ar; numa certa manhã, ligo a TV e me deparo com Ana Maria Braga e mais meia dúzia de famosos discutindo e analisando o perfil de cada participante do reality, e o rumo que este poderia tomar, a medida que os jogadores fossem saindo. Custei a acreditar que em meio á tantas questões mais serias à serem discutidas, um programa dedicasse tanto tempo (e reflexão oO) a algo tão banal. Audiência...
Algumas semanas antes, logo após o carnaval, lá estava o Faustão trazendo o vocalista do Parangolé, para ensinar a dançar o seu “Rebolation”, e ainda foi perguntado a ele de onde surgiu inspiração para compor tal sucesso (parece até ironia, mas não foi!), sim, o cara é compositor, e a inspiração veio quando ele assistia vídeos no youtube. (Posso fazer uma lista de bandas que mereciam muito mais aquele horário para divulgação de seu trabalho).
O que são destinados a nós são informações como esta, de caráter hedonista. No meio dessa produção do entretenimento entram também mortes, violência, drogas e tragédias de todos os tipos, empurradas goela abaixo, em plena hora do almoço, em programas de meio-dia.
Para conseguir uma matéria vale tudo, conversar com o acusado diretamente na cela, filmar corpos recém - assassinados, tentar à todo custo entrevistar a mãe ainda em choque que acaba de perder seu filho...
Após minutos de “tragédia” no ar, surge logo um merchandising, uma partida de futebol, ou o desenho animado, destinados à quebrar essa “tensão” e nos fazer voltar a passividade outra vez.
Me diz se não funciona? Claro que sim, nos acostumamos á ver a brutalidade ao nosso redor e achar que ela é mesmo mais um elemento do nosso cotidiano, por que já foi tão filmado que vira rotina, e se vira rotina, perde todo aquele sentimento que a gente sente quando entra em contato com alguma coisa nas primeiras vezes. Dessa forma, nos acostumamos a ouvir que um amigo foi assaltado e ao invés de questionar o mundo, pedir que ele tome mais cuidado, por que o mundo... ”Ah, o mundo ta assim mesmo...”.
Vira rotina, banalidade, e a gente se acostuma a cruzar os braços e não sair da posição de contemplador. Apenas comprando ingressos, matando a sede, sendo sedados, e quando o espetáculo acaba, (nem dando o trabalho de levantar-se) pegar o controle e mudar de canal.


* Título referente à música Chuva de Contairnes, de Humberto Gessinger.

23 de abr. de 2010

Dias de chuva são chatos. Não, eles não são não... A gente é que faz deles um dia ruim. (Como um dia ensolarado também pode se tornar um.) O que gosto nos dias de chuva é a sensação de poder dormir o quanto quiser, pois o frio e a falta de claridade de um dia nublado dão a sensação de que a hora passa mais devagar. Gosto também de ir dormir ouvindo o barulho da chuva, que tem um cheiro diferente quando se mora num lugar com árvores ao redor, ou ver filme. Só que a chuva não veio trazer essa boa sensação na noite em questão. Além de chover, também faltava luz, e além de faltar luz, faltava sono, logo, sobrava tédio. O conto a seguir vem inspirado numa noite como essa.




Eram desses dias monótonos em que falta luz e você está sozinha, sem nada pra fazer. Disfarçava a solidão no MSN, conversando bobagens com pessoas distantes, e lia frases do seu escritor favorito.
Comeu um pedaço de bolo de chocolate que estava na geladeira e continuou gastando o tempo no computador, com quem espera algo – ou mesmo o sono – para sair dali.
A plaquinha, ou uma das, que ela esperava ver o MSN avisar subindo, não deu sinal a noite inteira, ou pelo menos no tempo em que esteve. Continuou confortavelmente lendo e jogando conversa fora, até que em muito pouco tempo lhe roubaram a diversão. A energia se foi e de repente ela se viu cega e invisível. Só enxergava o silêncio.
E parece que com a escuridão tudo lhe saltava aos olhos; a solidão, o desperdício de tempo e a falta de um bom telefonema numa noite mal aproveitada.
Saiu tateando os móveis até achar a lanterna. Com um pequeno raio de luz, pegou duas velas e acendeu junto de si. Deitou na cama, mesmo sem sono, e olhou para o celular, que não emitiu nenhum ruído diferente. Pensou em ligar para milhares de números, concluiu ser melhor ficar consigo mesma.
Preferiu então um papel e uma caneta, e cheio de riscos, continuou tentando traduzir tudo aquilo que sentia. Sensações da menina solitária, numa noite chuvosa e escura, que daria tudo por uma ligação ou alguém que lhe quisesse contar histórias.
Alguém que naquele momento era impossível de encontrar. Então, naquele instante, ela decidiu ser pra si mesma esse alguém. O adulto que finge de sério, e acaba de escrever, e a criança fantasiosa que dentro de instantes estará lendo essa história.

18 de abr. de 2010

"Quem quer ser um milionário?"



Cá estou eu encantada com o ganhador do Oscar de melhor filme de 2009. Assistimos hoje e só sei que ganhou Oscar porque li a resenha (link abaixo), que inclusive exprime um pouco da minha opinião sobre o filme.
O dono da locadora disse tratar-se uma comédia ótima. Fiquei então pensando "Será que ele classifica de comédia um filme que lhe arranca alguma risada?" Não acho que seja um filme romântico nos moldes americanos genuínos (Cidade dos anjos, A casa do lago, etc.), mas é uma história de amor, sim, bem próxima de Romeu e Julieta. Sóque no filme o casal morre para a vida dura que levaram até ali.
Em vários momentos, o jeito apático do garoto parece indicar que sofre de algum problema psicológico ou mental...mas quem não sofreria, vivendo a miséria que ele viveu? Pois o Romeu indiano, que lembra um pouquinho, lá longe, o Ralph Macchio (Karatê Kid), porém sendo melhor ator.
Pois então, é a dica: romance, fé, amor, redenção, ressurreição...

3 de abr. de 2010

Ainda Sobre Russo

A jornalista, desinformada, a coitada, estava dizendo que "Renato Russo mantinha um caso de amor com Brasília..." então corri para diante da TV para ver do que se tratava. Seria o aniversário de Renato Russo. 50 anos. A idade de meu marido, Paulo. Olhei a TV, olhei para o Paulo meio desconfiada, pensei no Renato assim, meio Paulo, coroa, sem querer usar Internet, reclamando de barulho de guitarra. Bom, "as pessoas são diferentes..." concluí. Conclusão rasa, meu Deus, mas depois de uma repórter de jornal das 8 dizer uma barbaridade dessas eu não poderia pensar em nada melhor!
Vamos imaginar que a repórter, que tem seus 40 e poucos anos, tivesse sido abduzida nos 80' e nada viveu da cena do pop rock de então. Tendo sido devolvida pelos ETs, estudou jornalismo e foi trabalhar na TV. Nunca havia feito uma cobertura sobre rock e como havia ficado ausente (estava em outro planeta, lembram?), precisou pesquisar um pouco, para se preparar para a matéria. SE tivesse feito isso, saberia que nenhum punk ou roqueiro, e RR era os dois, cantaria amor a Brasília, não nos anos 80!
Mas a pobre falou isso, com Brasília às suas costas, sorrindo. Renato nem ligou, tomou todas, ta chapado em alguma esquina, ele "passarinha". Já eu, preocupada com umpouco de verdade e de História, fui arrumar minha papelada e encontrei uma pasta encardida com livro sobre a vida de Renato Russo, recortes de jornais, matérias e pôsteres de revista, tudo amarelado, cheirando a mofo. Pensei em jogar fora, mas lembrei de Marina (1 ano e 5 meses). Ela também vai se apaixonar, vai fazer (outros tipos de) recortes, e se eu jogar essas lembranças fora, vai pensar que os pais não sabem o que é isso. Sei sim. Tenho todos os CDs de Legião Urbana e Renato Russo...e há 14 anos não consigo ouvi-los. Saudades
http://www.terra.com.br/istoegente/34/reportagens/rep_renato.htm

30 de mar. de 2010

50 anos de Renato Russo




Quem me conhece pelo menos um pouco sabe do meu apreço pelo rock da década de 80. Então, já que andei sumida, não vejo hora melhor que postar, que não seja em meio ás comemorações do 50º aniversário de Renato Russo, integrante de uma das bandas nacionais mais marcantes da época.

Não procuro levantar nenhum tipo de fanatismo (pra falar a verdade nem gosto do termo fã) ou certo apego ao passado,, longe disso, sou só mais uma necessitada de música de qualidade, e que sofre para encontrar sons agradáveis (à cabeça e) aos ouvidos desde que bandas como a Legião Urbana pararam de produzir.

Talvez por que a impressão que tenho ao entrar em contato com nosso rock nos dias de hoje é de estagnação, falta de conteúdo, e, sobretudo de causa.Principalmente se pararmos pra analisar o histórico das produções musicais anteriores. No momento que antecede a aceitação e consequente consagração do rock oitentista estava a MPB e a Bossa Nova, carregadas de manifestações contra a opressão e a ditadura.

Após esse descontentamento, surgiram as primeiras bandas de rock, formadas por jovens que queriam dar uma nova "cara" á esse estilo no Brasil, que antes dependia de esporádicas apresentações de artistas internacionais como The Police e Van Halen.

Jovens como Cazuza, Gessinger e mesmo Renato, cada um á seu modo faziam da música uma forma de expressão de suas concepções a cerca da fase em que viviam, seja ela de cunho social, político ou sentimental.

Percebia-se que as composições próprias tinham importância para tais artistas. Notamos no próprio Renato, uma grande facilidade em alcançar dimensões distintas. Basta, por exemplo, ouvirmos Vento no Litoral e Geração Coca-Cola, para perceber tais diferenças.

Talvez por que até aí o lance da música como produto e do ouvinte como mero "consumidor" ainda não tivesse tão escancarado. Por ser um estilo recente, a onda era se divertir. Compor, tocar, em meio á noitadas, bebidas, drogas e relações (heterossexuais ou homossexuais) efêmeras. Fazendo assim com que os artistas da época fossem considerados representantes da juventude de sua geração.

Após a morte de Renato e outros artistas do momento, vimos surgir, no fim de 90 e começo de 2000, um novo panorama do rock no Brasil, representados por bandas como: Nx Zero, Fresno, Pitty, CPM 22, Hateen, Strike, entre outros. O pós-punk dava lugar ao Emocore. Com composições restritas á nostalgia do amor não correspondido, a produção começou a encontrar retorno num público também menor, de 10 á 18 anos.

Dentre as poucas bandas oitentistas que ainda estão na ativa nos dias de hoje, percebe-se que algumas, como Capital Inicial e o Frejat (em carreira solo), uma perda de identidade em consequência das exigências do mercado. A maioria, como os dois citados, prefere continuar regravando grandes hits do passado, já que é uma posição mais "confortável".

Outras, como IRA, Kid Abelha e Engenheiros do Hawaii decretaram uma pausa, antes de suscitarem virar couverts de si mesmos, como já falou o líder da última banda. Saindo da zona de conforto e acreditando que só tensa a corda vibra legal, Gessinger e Leindecker, líder da também em pausa Cidadão Quem, resolveram se juntar e ir em busca de um novo projeto, o Pouca Vogal.

Recordando agora uma entrevista dada por um artista de 80, concordo que "o maior sinal de respeito de um artista em relação ao seu público é não pensar nele quando cria. Não quero que os artistas dos quais eu gosto pensem em mim quando criam, que os políticos nos quais eu voto façam pesquisa pra saber como eu quero que eles falem e atuem. Quero que eles tenham uma visão e corram o risco de encontrar ou não quem se interesse por ela.”

Era isso que eu sentia - e ainda sinto - cada vez que coloco uma música da Legião pra tocar. Renato, que nem era russo, e sim Manfredini Junior, compunha com total racionalidade do que estava passando, e mesmo com a possível chance de não fazer sentido para alguns, lá estava ele jogando toda a sua sinceridade no palco, mesmo como um Trovador Solitário

Sinceridade e por que não personalidade, que parece estar cada vez mais escassa por aqui. Constato enquanto escrevo e ouço de fundo alguns cantores famosos, junto com a formação da Legião, tentando reproduzir alguns dos sucessos da banda como uma "homenagem" ao cantor que faria aniversário. Digo tentativa, por ter sido um fracasso. Seja pelos tons de vozes completamente opostos e desafinados, ou pela interpretação mecânica e nonsense de músicas tão conhecidas e adoradas, que falariam por si só.

Após tamanho fiasco, decido ficar por aqui, antes de começar a soar piegas e o tiro sair pela culatra feito o programa de Serginho Groisman. Antes, contento-me em dizer que Renato, com sua singularidade e talento, deixou uma imensa contribuição á nossa música. Ai de nós, em tempos de vazio como este, se não tivéssemos músicas e composições como as suas, para garantir a saúde dos ouvidos.

Ao Renato, os meus parabéns! :)

24 de mar. de 2010

Um dia sonhei com Isabela, alguns meses depois da tragédia. Sonhei que ia por uma rua e encontrava seu retrato numa sarjeta. Apanhei-o e, assim que o tive em minhas mãos, a imagem e o papel desfizeram-se... Acordei, pensei um pouco no sonho e levantei-me, dando início à rotina diária tomando o café da manhã para sair, acompanhando minha mulher ao ponto do ônibus, como fazia todos os dias.
Conversando, ficávamos esperando o transporte. Percebi, nesse dia, alguma coisa brilhante mergulhada numa poça d’água me chamando a atenção. Quando minha mulher se foi e eu voltava para casa, olhei o objeto que brilhava: era uma fotografia de uma menina mergulhada na sarjeta. Ao lado da foto tinha uma caixa de papelão abandonada e amassada, cheia de recortes de papéis e restos de fitas coloridas.
Meio sem jeito, por causa da quantidade de pessoas ao redor, apanhei a fotografia. Deixei escorrer e levei-a para casa, lavei-a e botei para secar. Não parava um só instante de pensar no sonho que tivera e no fato de ter encontrado aquele retrato, até que resolvi fazer um desenho em grafite sobre papel e desse desenho fiz esse poema, uma pequena homenagem a Isabela:



CACHOEIRAS E LUARES

Recolhi o teu sorriso na sarjeta
E o fiz correr aos cachos
Em cachoeiras de mares
E escadarias de luares

Resgatei os teus cabelos nus
Na umidez de uma alameda
E guardei-os no aconchego
Penumbral de uma gaveta

No escuro vi brilhar,
À luz do teu olhar de pingo d’água,
Silhuetas nas vidraças
De pouso de passarada,
Remo, leme, um cais,
Um pontilhão e uma barcaça...

Colhi as tuas mãos
Na aridez cínzea da rua
Lavei a tua tez
No gotejar tênue da pia
Toquei a claridade de uma manhã meio fria
Com lápis, borracha, algodão
Suspiros de maresia

A riscos de luz de sol,
Num papel de seda pura
Acendi em teu semblante
A iluminância da lua...
GRAMADOS GRIS

Desaba o mundo em terremotos,
Furacões e tsunamis,
Bombardeios, trombas d’água,
Hecatombes e Nardonis

Mostra o mundo suas garras
Derretidas, degeladas,
Cada vez mais afiadas

Mostra suas cartas e farpas
E diz também saber bater na cara
E jogar o jogo da insensatez,
Da cupidez, da arrogância,
Da falta de infância
De distâncias sextandares
Despejada como lixo pelos ares

Marcham roseirais ao cadafalso,
Murcham emílias belas
Sob o granizo teimoso em não derreter

Ao túmulo margaridas e begônias,
Madressilvas e peônias,
Flores de maio, orquídeas, beneditas
Lírios, hibiscos, boninas,
Sempre vivas desprovidas de vida...

Crisântemos sem casas,
Aguapés e pés de acácias
Adornam faces vitimais da criançada

Em descompasso, passo em falso,
Tropeçam e caem Isabelas aos pedaços,
Em cachos despetalados
Empalados em gramados gris