Gostamos de escrever e de pensar. Costumávamos trocar e-mails, mas decidimos expor nossas ideias a quem quer que queira vê-las, e assim surgiu o Abracabessa. Sem cedilha mesmo, porque tudo pode ser mudado - e mesmo que não seja para melhor, às vezes a mudança traz consequências fantásticas!

2 de fev. de 2010

Eu odeio Manoel Carlos



“Quando mulher diz não, quer dizer sim”

Ouvi essa frase pela primeira vez há 25 anos. Chamo-a de Princípio da Idiotice. Veio de um menino, adolescente como eu, enquanto caminhávamos de volta do treino da equipe de atletismo do colégio onde estudávamos. Estávamos na pista de corrida do Estádio Rei Pelé, eu mais à frente, ele e outro colega atrás, a poucos metros. Àquela distância em que podemos ouvir e fingir que não ouvimos, ou falar e fingir que não sabíamos que você estava aí.
O acompanhante lhe disse que queria pegar no meu cabelo, mas eu tinha dito que não podia. A isto, o menino de 13 anos, braços compridos, e músculos que não dão conta da altura do corpo, respondeu “Quando mulher diz não, quer dizer sim”. Ao que interferi prontamente, ficando de frente para eles “Mulher retardada. Porque quando EU digo não, quero dizer NÃO. Venha ver...” O final da frase, obviamente, era uma ameaça. Ridícula. De uma menina de 1,50m e 46kg que não contava nada ao professor, pois achava que devia se resolver sozinha. Caíram na risada e passaram por mim correndo e gritando coisas do tipo “Aaaaai, ela vai me morder, socoooorro!”. Eu fiquei lá, não saí do meu passo (se fosse hoje, eu diria “do salto”), andando calmamente feito um monge e tremendo feito bambu ao vento, pensando no que faria se a brincadeira deles tivesse ido além daquilo.
Ontem, assistindo à novela das oito, da Globo, vi essa frase estampada na grotesca cena do Zé Mayer e Antonelli. Depois de inúmeros capítulos imitando O Pensador, de Rodin, Mayer reencorporou O Canalha, papel que já viveu em milhões de novelas globais, onde usa de grosseria e força física para conquistar suas amadas. Giovana Antonelli faz o papel de uma jovenzinha cuja única preocupação é “Viver a Vida”. Igualmente canalha, ontem a nada convincente balzaquiana teve um ataque de regressão total e se transformou numa criancinha de história medieval, fugindo de seu algoz e indo parar dentro do roupeiro ... no quarto dele. OHHHHHHHHH!
Enquanto isso, o Thiago Lacerda e sua barba-em-eterno-crescimento, contracena com a perdida Helena o mesmíssimo discurso, no entanto com muito charme e elegância. Como Helena é “outro tipo” de mulher, a abordagem é outra, mas o Princípio é o mesmo, o da Idiotice.
Helena quer e não quer. Assim como a outra, diz NÃO quando quer dizer SIM. E assim se reproduz a eterna verdade, aquela que o menino da minha infância deve ter aprendido do pai dele, que aprendeu com o seu avô e por lá veio. Não acho que a TV tenha o poder de influenciar pessoas conscientes, mas mostrar esse tipo de atitude, sem fazer sua crítica, é admitir/aceitar/disseminar que a mulher, sendo imatura e insegura, não sabe o que quer, não sabe do que gosta ou o que deseja para si. Em se tratando de sexo então, o pudor, a moral, a repressão, a impedem de assumir suas opções. Assim, quando um homem toca uma mulher e ela diz NÃO ele ouve SIM. Afinal, a descabeçada, quando quer dizer SIM, faz charminho, muxoxo, olho de lagoa, e diz NÃO. E é por isso que o Mayer encurrala a mocinha. É por isso que a independente Helena beija o grandalhão...tudo sem querer, querendo.
Muito mais mulher é assumir o que quer. Aceitar o que é ofertado. E negar se não o quiser. E no dia em que mudar de ideia poder ir lá e tentar mudar a história. Eu, se fosse homem, escolheria sempre a Penélope Cruz em Almodóvar, a qualquer titubeante plastificada de Manoel Carlos.

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